Tornou-se outono entre a gente

Terminei de falar e ganhei aplausos. Me direcionei à mesa do professor, onde um copo com água me esperava. A turma, barulhenta, levantou-se e rumou à porta para aproveitar o intervalo. Eu tomava largos goles de água quando percebi, pela minha visão lateral, que alguém me aguardava. Devolvi o copo à mesa e observei que um rapaz sorridente estava de pé ao meu lado.

– Quer falar comigo? – Perguntei, sorridente.

Ele abriu os braços e olhou-me com profunda ternura. Me abraçou. Gosto muito de abraços – e acho-os ainda mais deliciosos quando são dados com vontade. O rapaz me apertou contra seu peito e encaixou o queixo no meu ombro. Fiz o mesmo. Ele era mais alto, então levantei sensivelmente meus pés para me encaixar nele também. E foi aí que aconteceu.

Assim como uma peça de quebra-cabeças se encaixa perfeitamente naquela a qual ela deve se encaixar para que o desenho faça sentido; assim como uma nuvem se mistura à outra com elegância; assim como duas mãos se fecham perfeitamente em oração… foi assim que meu abraço fez “click” com o abraço daquele menino.

Eu senti que ele estava de olhos fechados, porque toda a sua postura sugeria que ele estava na penumbra agradável das pálpebras. Eu estava arregalada, assustada, afinal, era um abraço perfeito. Fechei os olhos meio insegura, e foi no escuro dessa entrega que senti uma leve percussão. O coração dele batendo no meu peito. Sorri. Ele me apertou ainda mais forte, e retribui a pressão. Entendi que esse abraço era algo que esse rapaz, que eu nem sabia o nome, precisava. Descobri, no meio do caminho, que eu também estava precisando desse abraço há dias, há meses, há anos. Meus dedos estavam esmagando o tecido da camiseta dele e não senti vergonha por isso. A resposta dele foi a lágrima que umedeceu o meu pescoço.

Foi ele quem começou a despedida do abraço. Foi me soltando devagarzinho, como quem solta um passarinho com delicadeza. Eu tremia levemente. O rapaz sorria, com a cicatriz da lágrima pela bochecha direita. Minha mão esquerda foi escorregando pelo seu braço direito e fomos nos afastando. Quando nossas mãos se encontraram, ele beijou meus dedos, se virou e foi embora. Misturou-se com o restante dos estudantes que deixava a sala.

Hipnotizada, séria, percebi que precisava ir embora também. Meio boba, arrumei minha mochila e a segurei nas costas. Havia algo de estranho dentro de mim, como se… como se tivesse um outono a mais no meu interior. É como se o menino tivesse colocado um vaso de margaridas na estante da minha alma. Foi um botãozinho de rosas que nasceu no meu coração.

Eu nunca soube o nome dele.

 

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